"De outra maneira, se tu bendisseres com o espírito, como dirá o que ocupa o lugar de indouto, o Amém, sobre a tua ação de graças, visto que não sabe o que dizes?
Porque realmente tu dás bem as graças, mas o outro não é edificado.".
1 Coríntios 14:16-17
Anos atrás, um padre que ha muito vivia no exterior me explicava que apenas três línguas eram adequadas para os serviços da Igreja: o grego, latim e o hebraico / aramaico, pois foram os idiomas escritos na Cruz de Nosso Senhor. As línguas eslavas foram incluídas, por extensão, dizia ele, pois o eslavo foi concebido com base no alfabeto grego.
"Mas o que podemos dizer a respeito de São João Maximovitch?" lhe perguntava. Pois São João havia celebrado a liturgia em chinês mandarim.
Tentando esconder o sorriso diante da questão atraves de uma forçada cara séria,o velho padre me respondeu: "Então - o que eu devo dizer?"
A experiência da Santa Tradição e missão na história da Igreja de Cristo mostra-nos que o grego ou eslavo não são "línguas melhores" para a vida litúrgica, e elas não são "melhores" para a expressão da Verdade Ortodoxa, pois são simplesmente as línguas que foram utilizadas em séculos anteriores, desde que se tratavam de idiomas universalmente compreendidos, e línguas que faziam possivel articular a fé claramente para a salvação do mundo inteiro.
Hoje, esse não é mais o caso.
Aqueles que se agarram ao uso exclusivo das línguas litúrgicas, ou línguas missionarias, ou línguas de instrução, não só carecem de uma compreensão da vida dos santos, dos missionários, e da história universal da Igreja, mas também carecem de uma compreensão sobre o grande mandamento de Cristo: o mandamento do amor.
O amor foi a motivação e o método missionário de todos os santos, que usaram a linguagem do povo, entre os quais viviam.
São Nicolau do Japão vivia no meio de uma pequena comunidade russa no Japão, mas ele usou o japonês - por quê? Porque os santos tem sempre uma visão voltada para o exterior, e uma visão de longo prazo: olhando para fora para a evangelização das nações, e no longo prazo, em auxilio de preservação na fé dos filhos que já estão na Igreja.
Em ambos os casos (o alcançar o exterior e a conservação da fé entre os já ortodoxos), a maioria dos ortodoxos na América do Norte falhou miseravelmente:
Em países Multi-linguais como Canadá e E.U.A. vemos aqueles que buscam levar o Evangelho de duas formas: Os que trabalham nas jurisdições étnicas, visando proteger a sua linguagem do gueto, com quase nenhum interesse missionário para atender aqueles que estão ao seu redor. Temos tambem as chamadas jurisdições "missionárias" que concentram o seu trabalho quase exclusivamente nas pessoas da classe média, falantes de inglês.
Ambas as abordagens - pelo menos a nível diocesano - está muito aquém do caminho dos santos missionários, uma vez que ambos os grupos tendem a ver a linguagem como uma questão suprema - seja o grego, o russo, o inglês, ou qualquer outra língua.
Mas não seria possível atender a todos os tipos de linguagem dentro de um unico território? Não faz mais sentido abordar o testemunho ortodoxo com uma única língua unificadora?
Esta foi a ferramenta historicamente utilizada pelos católicos romanos na América Latina.
É também a abordagem dos ortodoxos que buscam instituir o trabalho missionário de hoje -ao inves daqueles que tentam ensinar os africanos a falar grego, ou aqueles que so pensam em desenvolver uma abordagem Inglês somente para as missões na América do Norte.
A abordagem dos santos é muito diferente.
São Inocêncio quando estava em missão no Alasca, encontrando-se num ambiente multilingue, não tentou impor o eslavo aos nativos do Alasca, embora muitos russos já estivessem mantendo as igrejas cheias no Alasca. Ele poderia ter tomado para si o argumento de que eles tinham muitos fiéis russos para cuidar, e que os nativos seriam bem-vindos, desde que estivesse dispostos a submeter-se ao ambiente da Rússia e do uso da língua eslava litúrgica... Ele poderia ter feito isso ,mas não o fez.
A questão é: por que não foi por este caminho?
A resposta é encontrada na presença do amor cristão.
O trabalho missionário ortodoxo deve ser estabelecido tendo como base, em primeiro lugar, o amor cristão - o amor que está disposto a deixar para trás qualquer coisa referente a língua ou a cultura que seja secundário para o Evangelho, ou tudo aquilo que crie uma barreira para o compartilhar da fé ortodoxa.
São Nicolau do Japão tinha esse amor, como também os santos Cirilo e Metódio, e os santos da missão do Alasca.
Este é o motivo e o sustento da missão real, verdadeira. Sem ela, todo o trabalho da Igreja torna-se inevitavelmente como o de um clube, pois há falta de amor, se instituem grupinhos dentro deste clube, levando a muitas almas fiéis para fora da paroquia,e eventualmente,ate mesmo para fora da Igreja.
Há aqueles que ainda hoje defendem o argumento de que o uso de uma língua estrangeira ou ligada a um determinado contexto cultural proporciona uma proteção contra as influências do modernismo e do ecumenismo.
Isso simplesmente não é confirmado na experiência da Igreja!
Quando olhamos para as mais culturalmente bem realizadas missões de hoje - na China, no Japão ou Alasca - encontramos as comunidades cada vez mais tradicionais, com um espírito transbordando de amor, apesar da pobreza material, e tudo isso ocorrendo em igrejas locais.
Mas quando olhamos para a maioria dos grupos culturalmente intransigentes - particularmente as jurisdições gregas no Ocidente sob o Patriarcado Ecumênico de Constantinopla -, encontramos a participação mais vigorosa no ecumenismo, e a abordagem mais liberal na vida paroquial, apesar da riqueza material existente.
A história nos apresenta uma série de exemplos de cristãos ortodoxos que se recusaram a falar a linguagem do Céu, graças ao seu orgulho cultural e linguístico.
Os ortodoxos celtas na Grã-Bretanha, os cristãos Vikings do Atlântico Norte, alguns dos ortodoxos do Norte da Africa dos primeiros séculos, e outros. O que vemos, depois de séculos, em cada um desses casos, é a presença da Igreja Ortodoxa ser apagada, com os templos da igreja reduzidos a pó, substituidos pela adoração de falsos deuses, sendo o materialismo não menos importante entre eles.
Esse é o fruto do chamado testemunho ortodoxo que não teve amor suficiente para ultrapassar as barreiras culturais e lingüísticas.
A língua de Cristo, a linguagem do Céu, não é uma língua da terra, nem uma linguagem que resultou da punição do Senhor a partir da divisão da humanidade na Torre de Babel.
A linguagem do Céu é a linguagem do amor, o amor que brilha através da vida missionária dos santos de Deus, que assim como São Paulo, tornou-se um gentio pela causa da salvação dos gentios.
Qualquer outra abordagem simplesmente não coincide com o testemunho e o caminho dos santos,sendo eles intencionalmente missionários como os Santos Paulo, Inocencio
Nicolau, Cirilo e Metódio, ou acidentalmente missionários (aqueles ortodoxos que se encontraram em dado momento no meio de pessoas não ortodoxas tambem em terras não ortodoxas)
A linguagem do Céu, como a Fé Ortodoxa, é universal: é a linguagem do amor,
e não o grego, o russo ou o inglês.
Padre Geoffrey Korz