Pequenos milagres de São Serafim de Sarov |
São Serafim de Sarov
Ao alvorecer de uma manhã de Setembro, quando o sono do preguiçoso é especialmente doce, o telefone tocou alto no meu apartamento. Do outro lado da linha uma sala suave me indagou : "Sexta-feira virá o Anjo, você está pronto?" Um turbilhão de emoções e pensamentos invadiu minha mente ainda entorpecida pelo sono. Que anjo é esse meu Deus, será o Anjo da morte? Porque na sexta-feira?... É para estar pronto para o que? Será um contato extra-terrestre ou uma brincadeira... E eu, que tantas vezes rezei a ele diante de seu ícone, implorando - Meu amado batiuchka, quando afinal terei oportunidade de visitá-lo lá em Divevo... - Pois agora, através dos lábios do Padre Mitrofan o próprio São Serafim estava me convidando para ir ve-lo. Na manha seguinte gostariamos de comungar, portanto era imprescindível ler as orações preparatórias para a comunhão(Právilo), mas a luz foi desligada. Os peregrinos exaustos dormem um sono profundo. Fico imaginando onde posso ler as minhas orações e eu mesmo respondo que não há lugar. Então me defendo, Deus irá resolver para mim, de manhã haverá tempo... E assim vou adormecendo. De manhã, na correiria, é claro que não houve tempo para ler as orações. No silêncio da Igreja ressoa forte o telefone. Pela conversa consigo entender que algo está errado com a primeira liturgia, o severo batiuchka precisa sair com urgência. Segue-se uma agitação, as monjas caminham de lá para cá, telefonemas, cochichos combinando a vinda de alguém. Eis que parece um favorável prenúncio, pois apareceu o tempo necessário para ler as orações e me preparar. Corri para pegar meu livrinho. Essa confissão foi especial para mim. O Padre estava receptivo comigo, como se eu fosse da sua família e me confortou. Fiquei impressionado com tamanho amor ao próximo que ele tinha para dar. Onde está a origem deste amor todo ? Como pode uma pessoa como ele, que ouve confissões não ficar decepcionado com as pessoas e não odiar a essência pecadora do ser humano ? Ele não deteriorou o sacramento da confissão, não transformou-o em uma pura formalidade. Ele ouviu longamente e não me interrompeu. Por fim, usando o exemplo dos santos Pais e da experiência própria me esclareceu meus erros e apontou caminhos que levam a salvação. Eu comentei em particular, sobre a minha dificuldade em aguentar de ter à minha volta um ambiente contra-Deus, como deboche e zombaria em relação a mim e a minha fé. "Eu fui perseguido e você também será perseguido", falou emocionado o Padre e deteve-se pensativo. Eu reconheci de imediato as palavras do Senhor e com humildade e pavor sentia a SUA presença. Estremeçi. "Então nós também seremos perseguidos!" O Padre me contou que tinha sido militar e por todo o tempo de serviço nunca na vida tomou um copo de vodka, nem fumou um cigarro, não se permitia a nada de errado. Rezava em segredo e não mostrava sua fé a não ser para Deus, eram tempos ruins. E agora ele era ieromonge. "Veja o peixe, ele vive no mar salgado mas não se torna salgado" Assim falava o batiuchka, cheio de amor fraterno. "É assim que você deve ser. Você vive na lama, mas não se suje nela. Se você porventura tropeça e cai, se apresse em se levantar, limpe-se, arrependa-se diante de Deus. Nós ortodoxos devemos nos salvaguardar na pureza, e a pureza já é meio caminho para a salvação." Essas palavras do meu confessor, se firmaram fortemente no meu coração, pela simplicidade e ao mesmo tempo porque continham muita força interior. Na minha viagem de volta para casa, as palavras se repetiam em modulações : "O peixe do mar não se torna salgado, o homem na lama não se suja". |